Entrevista com Virgínia Casagrande: caminhamos juntos. “Passamos por muitas coisas juntos. Foram muitos desafios”
No último dia 8 foi comemorado o Dia Internacional da Mulher, uma data que simboliza a luta e as conquistas femininas na sociedade. O Consórcio de Notícias do Espírito Santo (CNES), por meio dos portais do grupo Política Capixaba, segue sua série de entrevistas especiais com as mulheres que se destacam no cenário político e social do Estado.
Até aqui, estiveram entre as entrevistadas especiais do Mês da Mulher:
Juíza Coordenadora de Combate à Violência Doméstica, Hermínia Azoury; ( Clique e acesse )
Deputada Estadual, Camila Valadão; ( Clique e acesse )
Capitão do Corpo de Bombeiros Andreza Nascimento; ( Clique e acesse )
Vereadora de Vila Velha, Patrícia Crizanto. ( Clique e acesse )
Cada uma delas, em sua história de vida e atribuições públicas, passou para os leitores o significado das singularidades e potenciais individuais, que elas unanimemente atribuem a muita luta e, principalmente, à educação.
Seguindo a proposta de levar ao conhecimento dos leitores as experiências dessas mulheres, ressaltando o poder e a necessidade da educação, além da urgência de políticas públicas concretas para a criação e consolidação de ambientes sociais seguros para as mulheres, com oportunidades de desenvolvimento e igualdade de direitos, a próxima entrevistada especial é a primeira-dama do Estado, Maria Virgínia Moça Casagrande.
Casada desde 1990 com o atual Governador do Espírito Santo, Renato Casagrande, com quem tem dois filhos (Milla Casagrande, mãe do seu primeiro neto e Victor Casagrande), ela é natural da capital Vitória e tem 62 anos.
Hoje, aposentada como dentista tem uma atuação categórica nos bastidores do poder, onde exerce com discrição sua força como companheira e consiglieri de Casagrande, que alcançou projeção política ao longo dos 30 anos de casamento, sendo deputado federal, senador e novamente governador.
Ela falou sobre barreiras, família, educação e, é claro, sobre política.
Confira a quinta entrevista da série especial do Mês das Mulheres:
O que chama a atenção da senhora dentre as lutas e conquistas recentes das mulheres?
Eu venho de uma família de classe média. A gente acaba seguindo um pouco o exemplo de nossas mães. A minha mãe foi uma guerreira. Veio de outro país. Morava em Portugal e resolveu morar no Brasil, então precisou vir de navio sozinha, na época do pós-guerra. Ela se casou através de procuração do meu avô. Por aí, se percebe que há uma história de luta.
Hoje em dia, claro que foram muitos os avanços nos direitos da mulher, que vão muito além da questão do voto. Essa data serve para que possamos refletir sobre tudo isso.
Graças a Deus, agora temos a Secretaria de Mulheres, que foi um avanço dentro do governo, com a Jaqueline Moraes, que foi nossa vice-governadora no último mandato do Renato.
Isso é um outro grande avanço, pois ela já havia se tornado a primeira vice-governadora do Espírito Santo. Essa marca fica. Como secretaria, ela encara muitos desafios, mas essa marca ficará. Ela será a eterna primeira vice-governadora do Espírito Santo.
Então, dentre tantos avanços, acho que esse é marcante para nosso Estado. Posso dedicar a ela, que é uma mulher de luta, esse dia especial, esse mês em que se comemora o dia Internacional da Mulher.
No primeiro mandato, por exemplo, fizemos uma exposição aqui no palácio Anchieta, um encontro com mulheres vítimas de violência, que covardemente formam atingidas no rosto. Então a gente tem as dentistas que atendem como voluntárias.
Continuo sendo madrinha da Turma do Bem e tenho minha participação em projetos ligados à primeira infância.
Gostaria de destacar alguma mulher que foi inspiradora para a senhora?
Essa é uma data comemorativa para pensarmos em todos os outros dias, afinal, todo dia é dia da mulher. Eu cito o exemplo da minha irmã, para falar de uma mulher que me inspirou. Ela começou a dar aulas muito cedo. Deu aulas na rede pública, na rede particular e por isso, ela conseguiu conviver com todas as esferas da sociedade capixaba.
Ela dava aula no Colégio Maria Ortiz, no Martin Lutero, que era particular, e também deu aulas no supletivo. Aprendi com ela a ver e sentir essas diferenças que existem na nossa sociedade.
Ela pôde conviver com a turma batalhadora, que estudava, mas que tinha de trabalhar. Eram mundos diferentes. Ela cursou na época, a Escola do Carmo, que era muito rígida com as meninas. Ali havia muitos tabus, muitas coisas que uma mulher não podia fazer.
Ela é dez anos mais velha do que eu e fez uma grande diferença na minha vida. Minha irmã é um bom exemplo de conquistas.
Há atualmente muitos discursos sobre a liberdade e independência da mulher, sobretudo ligados ao feminismo. A senhora se sente uma mulher realizada?
Eu me sinto uma mulher realizada, sim. Tenho dois filhos e um neto. Isso já faz com que eu me sinta realizada. Como mulher, isso me completa. Tive a graça de nascer em uma família de classe média, pude fazer a faculdade. Na época, odontologia. Um curso que só tinha na Ufes. No terceiro período, quem não tivesse um pouquinho de dinheiro já desistia, porque a lista de materiais era enorme, os livros eram caros.
A gente tinha esse sonho de entrar na faculdade, mas a gente não tinha noção de quanto isso custaria. Venho de uma família que não tinha nenhum dentista. Não tinha um tio ou um pai para abrir portas profissionais. Então, o consultório e todo o restante tiveram de ser montados com muito esforço.
Entrei cedo no mercado de trabalho. Cheguei a trabalhar na prefeitura, num projeto de expansão para concluir meu curso. Foi assim que conheci o Renato. Trabalhei em consultório e assim que a gente criou os filhos.
Agora estou mais confortável, porque me aposentei e posso contribuir mais com o governo.
Como percebe o papel e a atuação das mulheres na política e em outros campos da sociedade?
Na política, eu percebo que tem aumentado a participação das mulheres, o que é extremamente necessário. Porque é através da política que a gente consegue adquirir os direitos e fazer com que sejam cumpridos os deveres.
Tenho notado que existe um grande avanço, sim. Ainda há muita luta, mas temos muitas boas representantes, tanto na esfera estadual, quanto na esfera federal.
A mulher naturalmente tem três turnos de trabalho, porque trabalha fora, trabalha em casa, é mulher e é mãe. Acho que nossa jornada aumentou, de certa forma. Eu noto que a mulher tem de fato uma rotina muito puxada. São muitos os avanços adquiridos por nós mulheres, assim como são maiores os trabalhos e a responsabilidade. Agora, não se pode perder o carinho.
Nossas lutas têm de carregar consigo o lado feminino, pois as mulheres estão à frente, vá me desculpar, há muito tempo. As mulheres estavam tímidas, oprimidas ou no anonimato. Mas mesmo do anonimato, a gente prepara caminhos, com jeitinho, com ternura e acho que é dessa forma que as lutas devem ser encaradas.
As lutas são importantes, assim como as bandeiras, as passeatas, afinal, foram muitas lutas trágicas.
Agora o que a gente precisa é ter políticas públicas fortes, para que as mulheres consigam dar aos filhos uma bagagem emocional e educacional. A educação é a base de tudo. Minha mãe apostou na minha educação, a mãe do Renato apostou na educação dele.
Quais as orientações que a senhora dá para sua filha e que podem servir para outras jovens, para que elas cheguem à sua idade se sentindo realizadas?
Nós fomos criados a base de provérbios. Meu pai tinha uma frase com que ele brincava: “Quem herda, não compra”. Isso quer dizer que a gente recebe aquilo que nossos pais nos passam. Não tem de inventar moda. Nós somos cinco filhos.
Os meninos estudavam em escola pública e as meninas tinham de ir para escolas de freira. Era uma visão machista, sim. Mas ele queria a melhor educação para as filhas. Melhor no sentido de ter essa orientação moral, essa proteção.
Da forma que minha mãe me orientou, eu busquei orientar minha filha. Claro, que ela é mais jovem, mais irreverente. Mas a gente deu uma liberdade para ela de pensamento, de profissão, de escolhas de vida.
Hoje ela não mora perto da gente, mora em Brasília. Por opção, ela cursou Direito. Ela tem esse livre arbítrio e opções de escolha, justamente por ter se formado em nível superior. A gente deu educação, mas deu liberdade de escolha para ela buscar o que queria fazer.
Nossa família também precisou quebrar barreiras. Na época da minha irmã a mulher que quisesse estudar, tinha de ser professora. Ela queria fazer arquitetura, mas não tinha arquitetura aqui no Estado, só no Rio de Janeiro e meu pai a proibiu. No meu caso, não tinha ninguém na família que tinha feito odontologia.
Qual é o papel da educação para que as mulheres consigam conquistar espaço na sociedade?
A família é a base de tudo, mas a educação é primordial. A criança deve ter esse contato com os mestres. A gente incentiva e a educação tem se ampliado muito no mandato do Renato.
Acredito muito nos programas de incentivo ao esporte, justamente para trazer as crianças para esse contexto da escola. Estamos lutando por uma escola mais aberta, mais libertadora, com uma outra visão.
Como foi conciliar sua profissão e a criação dos filhos com a vida de companheira de um líder político, como o Governador?
Em casa ele não é o Governador. Na família do Renato ele é o filho do meio. Então, teve os irmãos mais velhos para ouvir e os mais novos para ele orientar. De certa forma, acho que ele conduz assim a política.
Ele sempre teve muita tranquilidade, para não levar tantos problemas para casa. Está tudo sempre bem. Na função de Governador é um pouco diferente, a gente acaba se envolvendo mais. Mas nos outros mandatos, que ele teve como deputado ou senador era algo bem mais tranquilo no relacionamento familiar. E isso deixa a família muito confortável.
Em 2020, a senhora teve um acidente vascular cerebral (AVC) e foi internada por conta da Covid-19. Sentiu medo?
O AVC, segundo os médicos, pode ter sido desencadeado pelo próprio vírus do Covid-19. Foi um AVC mínimo, perdi o movimento do braço quando fui pegar uma xícara de café para minha cunhada, mas no caminho para o hospital o movimento já foi se restabelecendo. Fiz a bateria de exames e logo depois veio o diagnóstico de Covid-19. E isso foi no auge da pandemia.
O Renato, na função de coordenar essa pandemia, foi nos hospitais, na linha de frente. Teve de trabalhar a questão da pandemia com o Governo andando. O Estado não podia parar.
O que mais me deixou baqueda foi ter de ir para o hospital e deixar o Renato e a minha filha com Covid, em casa. Eu sempre cuidei deles. Mas no hospital, quem cuidou de mim foi meu filho. Ele foi médico, foi enfermeiro, foi fisioterapeuta, me ajudou muito. Ter a família por perto é sempre algo muito bom. Já tive aí o meu retorno do carinho e de cuidado.
Em algum momento já recebeu propostas para disputar cargos eletivo? Já chegou a considerar essa possibilidade?
Eu sou o trunfo na manga do Renato, ele brinca, dizendo que se eu aparecer vão acabar me chamado para disputar algum cargo. Já houve convites generosos de pessoas, mas acredito que por simpatia e até por brincadeira.
Eu e ele caminhamos juntos. E nesse caminho, eu nunca tive nenhuma ambição por cargos, portanto eu nunca cogitei me candidatar.
O próprio Renato nunca imaginou ser governador. Ele se formou em Engenharia Florestal. Os planos dele eram dar aulas numa universidade, em outra cidade. Mas ele decidiu voltar para Castelo.
Ele tinha o pensamento de que se a cidade deu oportunidade para que ele pudesse ir para universidade, ele deveria retribuir. Ele sentia que tinha essa dívida.
Eu também penso um pouco assim, pois a gente acaba usufruindo do investimento na universidade e investimento pressupõe retorno.
É o caso das ações afirmativas, onde muita gente boa, inteligente e talentosa não teria condições de entrar no ensino superior. Eu não teria feito odontologia se soubesse, na época que era tão caro.
As pessoas que já nascem com oportunidades, muitas vezes não enxergam o quanto é difícil chegar a algum lugar.
Mesmo seu marido sendo um político renomado, a senhora manteve a sua profissão. Como a enxerga a sua individualidade diante da carreira do seu marido?
Eu não preciso ter um cargo eletivo, para exercer meu papel de cidadã ou mesmo dividir com o Renato algumas ideias de projetos. Tenho muito orgulho de Renato ter chegado aonde ele chegou e acho que ele corresponde.
Ele tem uma boa avaliação das pessoas por onde a gente viaja. Veem nele um político sério. É muito bom e muito gratificante acompanhá-lo. Tenho muito orgulho de onde ele foi parar, de que forma ele conseguiu e do reconhecimento que as pessoas têm pelo trabalho dele.
A senhora acompanha de perto as notícias do universo político?
Eu acompanho de perto a notícias e às vezes peço para o Renato me atualizar das informações de bastidores, porque essas mudanças são velozes. Agora com as redes sociais, ainda mais. Mas eu sempre acompanho, afinal, a gente é um ser político.
A política começa na sua relação familiar e na relação com os vizinhos. Quem nunca ouviu falar da famosa política da boa vizinhança?
Pode citar alguma decisão importante que contou com o seu conselho?
Passamos por muitas coisas juntos. Foram muitos desafios. Aquela chuva no fim de 2013, em que ele precisou ver tudo de perto, foi um exemplo. Os desafios acontecem para nós dois e essa tomada de decisão é unida.
Outro exemplo de momento desafiador foi a época da pandemia. Porque ele teve de se tornar um estadista, era dele que se esperavam as decisões.
Então, não foi um momento fácil. Até porque ele é mais democrata, mais adepto ao diálogo. Foi um momento que trouxe muita tensão. Mobilizou a toda a sociedade civil organizada, assumiu a responsabilidade e dividiu com todo mundo os resultados. Foram momentos bem difíceis, mas acho que nos saímos muito bem.
Carlos Mobutto | Jornalista da AZ
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